quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Exumação


Pense num corpo que faleceu em 27 de junho de 2011 e que, ao falecer, sua mente permaneceu intacta, funcionando a todo o vapor. Ali, por dentro, ele pedia por socorro, pra que alguém ouvisse um grito que ele não conseguia dar.
Pense num funeral nada digno. Esse corpo foi jogado numa caixa de madeira, de qualquer jeito, e depois enfiado terra abaixo. Sem cerimônias, sem comoção. Sem sequer uma voz pra dizer adeus. E então, durante todo esse tempo, ele ficou olhando para o teto do caixão, pensando em quem fora o responsável pelo seu enterro precoce. No começo, ele ainda era capaz de perdoar, mas com o tempo, ele pode ver que, em vida, não passou de um objeto para o coveiro. 
Um objeto muito valioso pra permanecer enterrado.
Por uma ou duas vezes, talvez em sonho, ele se projetou para fora da terra. E lá estava o coveiro, com uma outra vítima qualquer sorrindo inocentemente, sem saber que ocuparia a cova ao lado. 
E então, num dia sem importância, eu ouço a terra sendo revirada perto de mim. Era um novo enterro. Finalmente o coveiro havia se cansado do brinquedo novo. 
E, estranhamente, quis o velho de volta.
Mas o velho ficou quatro meses enterrado,pensando toda noite em porque estava ali a contra vontade, pensando em todos os erros que tinha cometido, e sabia bem que não valia a pena cometê-los outra vez. Não iria pedir desculpas por coisas que não fez, nem assumiria culpas que não tinha o dever de carregar. Quatro meses enterrado muda o corpo e a cabeça de um homem. Estranho não saberem disso.
Estranho te desenterrarem depois de tanto tempo e esperar um abraço apertado e todo o carinho de volta. 
Estranho querer resgatar o passado que você mesmo enterrou. 
Não se surpreenda se ele for mais esperto que você e te enterrar na mesma vala.

2 comentários:

A "Princesinha" do Castelo de Areia disse...

Não sei porque... mas gosto tanto do que escreve... Me identifico, sei lá! o.O


=)

Etho disse...

Também me identifico HAHA
^^